I – Primeiros Passos (1989-1992)

O NMD-UFSC sucedeu ao Grupo de Pesquisa em Ecodesenvolvimento (GPE), criado por Paulo Freire Vieira em 1987, no âmbito do Programa de Pós-Graduação em Sociologia Política (PPGSP-UFSC). A iniciativa de criar o GPE foi tomada logo após o seu primeiro estágio de pós-doutorado junto ao Centro Internacional de Pesquisas sobre o Meio Ambiente e o Desenvolvimento (CIRED), em Paris, sob a orientação do professor Dr. Ignacy Sachs. Mais especificamente, o GPE foi concebido para consolidar uma proposta de investigação até então pioneira na UFSC, centrada no tratamento analítico do binômio ecologia & desenvolvimento. Este grupo exerceu um forte efeito dinamizador no processo de consolidação gradual, no PPGSP, de uma linha de pesquisa sobre Movimentos Sociais e Ecologia Política. Nela vieram à tona contribuições seminais acerca da gênese e da estruturação progressiva de um movimento ecologista multissetorializado no País (VIOLA et al., 2001).

Na etapa inicial, conduzida com o apoio de apenas um bolsista de iniciação científica, os principais tópicos da agenda de pesquisa do GPE contemplavam as implicações do novo paradigma sistêmico para o avanço da teoria ecológico-humana, mediante a reconstrução das principais linhas-de-força do debate sobre os condicionantes estruturais da crise socioecológica e sobre as possíveis alternativas tendo em vista a compreensão e o enfrentamento dos seus condicionantes estruturais. Procedeu-se assim a uma revisão ordenada da literatura internacional de ponta produzida no período 1968-1985, com ênfase para os trabalhos dos grandes precursores da ecologia política, a exemplo de Denis Meadows, Ignacy Sachs, Johan Galtung, Ivan Illich, Barry Commoner, René Dumont, Andre Gorz, Jean-Pierre Dupuy, Kenneth Boulding, Karl W. Deutsch, Karl William Kapp, Henri Laborit, Ervin Laszlo, René Passet, Madhav Gadgil, Edgar Morin, Pierre Dansereau, C.S. Holling, Arne Naess e Edward Goldsmith, dentre outros.

No tratamento específico do binômio ecologia & desenvolvimento, o foco incidia na caracterização da estrutura conceitual, das diretrizes metodológicas e dos fundamentos epistemológicos e éticos do enfoque de ecodesenvolvimento, promovido na época pelo CIRED e pela Fondation Internationale pour un Autre Développement (FIPAD) no transcurso das décadas de 1970 e 1980. Tratávamos de elucidar una noção que havia sido introduzida na linguagem acadêmica ao mesmo tempo como uma categoria analítica baseada na teoria ecológico-humana e como uma categoria de corte operacional – ou melhor, uma construção ideológica destinada a reorganizar e redirecionar o planejamento e a gestão simultaneamente integrada e compartilhada de ações coletivas face às evidências de “limites à dinâmica pervasiva de crescimento material ilimitado numa biosfera finita” (MEADOWS et al., 2012).

Como parte de um acordo de cooperação estabelecido com o CIRED, foi articulado um programa de pesquisa empírica de longo fôlego, intitulado Avaliação de impactos socioecológicos e planificação do ecodesenvolvimento: o caso do estado de Santa Catarina. Este programa articulava dois subprojetos: o primeiro, relacionado à problemática da delimitação e do fomento da ecologia humana sistêmica na comunidade científica brasileira; e o segundo, relacionado à análise das condições gerais de viabilidade de uma política agro-industrial alternativa para o meio rural catarinense, baseada no conceito de bio-industrialização descentralizada. Este último vinha sendo difundido, na época, pela Universidade das Nações Unidas (por intermédio das iniciativas de Ignacy Sachs à frente do CIRED). Os relatórios parciais foram submetidos a discussões regulares no âmbito do Grupo de Trabalho em Ecologia, Política e Sociedade, responsável na época pelo esforço pioneiro de sensibilização dos pesquisadores vinculados à Associação Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Ciências Sociais (ANPOCS).

Os títulos dos trabalhos publicados neste período oferecem uma visão panorâmica das várias linhas de reflexão conduzidas pelo GPE: (i) Ciência e tecnologia para o ecodesenvolvimento: prioridades para Santa Catarina, (ii) Ecodesenvolvimento e política agrícola (iii) Rumo à revolução azul: contribuição à pesquisa de estratégias de aquicultura sustentável em zonas costeiras do Sul do Brasil, (iv) Educação ambiental em Santa Catarina: diagnóstico preliminar e diretrizes para o futuro, (v) Simulação por computador na pesquisa e no planejamento de sistemas socioambientais, (vi) A problemática ambiental e as ciências humanas e sociais no Brasil (1980-1990), (vii) Subsídios para a formulação de uma política de fomento à pesquisa socioambiental no Brasil.

No rol das atividades de ensino, a produção científica do GPE foi difundida e debatida no contexto dos seguintes cursos de graduação e pós-graduação oferecidos junto ao Centro de Filosofia e Ciências Humanas da UFSC: (i) Pesquisa de sistemas sociais e epistemologia (junto ao Curso de especialização em Filosofia da Ciência), (ii) Epistemologia das ciências sociais (junto ao Departamento de Ciências Sociais), (iii) Crise e redefinição do pensamento social, Modelos de desenvolvimento alternativo: introdução ao ecodesenvolvimento e Metodologia de pesquisa (junto ao PPGSP). Além disso, uma parte substancial do trabalho do grupo foi concentrada na organização de seminários especiais e colóquios, valendo a pena destacar a colaboração do professor Dr. Eduardo José Viola e de vários pesquisadores franceses vinculados ao CIRED – a exemplo de Michel Schiray, Dália Maimon e Olivier Godard (VIEIRA, 1992; VIEIRA; MAIMON, 1993).